domingo, 6 de abril de 2014

Resenha: The Immigrant

Imagem: Reprodução/Obsession

James Gray é um diretor que chamou atenção com o trágico Little Odessa em 1995, aos 25 anos. Depois, o norte-americano ficou conhecido por seus dramas policiais The Yards (2000) e We Own The Night (2007) e o melodrama Two Lovers (2008). Durante todo esse tempo, ele ganhou reconhecimento não por suas bilheterias, mas pelas histórias extremamente dramáticas, intensas e sua capacidade de explorar os talentos de seus atores de forma magistral. Em 2013, foi a vez dele, pela primeira vez, dar um papel principal a uma atriz e, pela quarta vez, a oportunidade de Joaquin Phoenix dar mais um show de atuação.


The Immigrant é um filme ambientado em Nova York – o cenário de sempre do cineasta - no ano de 1921, quando um navio de imigrantes chega ao porto de Ellis Island. Ewa (Marion Cotillard) e Magda (Angela Sarafyan) são polonesas que buscam viver o sonho americano, depois de passarem por maus bocados na terra natal, incluindo assistir a morte dos pais durante a 1ª Guerra Mundial. Porém, Magda contrai tuberculose na viagem e é obrigada a permanecer em quarentena, deixando Ewa sozinha no lugar, sem onde ficar e, portanto, ilegal. Neste momento, surge Bruno (Phoenix), um cafetão que tem um trabalho com imigrantes ilegais e encontra na enfermeira uma forma de expandir seu negócio. Com seus contatos, libera a mulher.

Obviamente, Ewa aceita se prostituir a fim de juntar dinheiro para conseguir liberar a irmã e construírem uma nova vida nos Estados Unidos. Afinal, essa era sua única opção, pois sua entrada na nação foi negada e Bruno foi quem a ajudou. A partir daí, vemos todo o sofrimento e determinação da polonesa em usar o próprio corpo para sobreviver, lidar com o abusivo e temperamental chefe e ainda se proteger da polícia. O encontro com Orlando (Jeremy Renner), primo de Bruno, pode ser sua salvação, mas essa relação tem tudo para terminar de forma trágica.

Antes de tudo, é preciso dizer que A Imigrante é um melodrama mesmo, com letras maiúsculas. É um longa sombrio, triste e duro e Gray faz questão de deixar isso transparecer com a fotografia. Com o brilhante cinegrafista Darius Khondji e uma ótima equipe de cenário, figurino e maquiagem – o orçamento foi de apenas $ 16 milhões -, ele fez um trabalho magnífico ao nos contar tal história. Temos aqui um predomínio de cores como preto e marrom, e um efeito sépia na edição, o qual deixa a película com uma cara ainda mais fria. Ele também explora bastantes efeitos de luminosidade em determinadas cenas, os quais dão um tom que remete aos filmes mudos da década de 1920.

Uma coisa que cativa aqui são pequenos detalhes que fazem toda a diferença no roteiro. Uma das cenas mais bonitas de The Immigrant mostra Orlando fazer uma apresentação de mágica e dar a Ewa uma flor no final da performance. Sozinha, carente e sem amor à sua volta, a imigrante se comove com aquilo e guarda a flor com todo o cuidado. No entanto, poucos dias depois vemos a flor já morta, no móvel ao lado de sua cama; um aviso de que aquele promissor amor com o homem estava fadado ao fracasso e rapidamente. Outra parte que me tocou bastante mostra Ewa pegar um alfinete, espetar o próprio dedo, usar seu sangue como batom e depois dar tapas no rosto para dar um efeito de blush. Isso porque ela ia a um evento para os imigrantes confinados e queria ficar mais arrumada. Difícil não se comover e não sentir pena; ainda mais com uma pessoa como Cotillard no papel.

Na verdade, praticamente todas as cenas protagonizadas por ela são de uma qualidade indescritível. Em seu primeiro papel protagonista em um filme em inglês, a francesa interpretou a personagem de Gray com tamanha dedicação e talento que é impossível não se envolver. E olha que o cineasta só soube quem ela era alguns anos atrás, quando Guillaume Canet o convidou para ajudá-lo no roteiro de Blood Ties. O americano gostou tanto dela que escreveu o filme especificamente para artista e com um bônus de 20 páginas em polonês (língua que ela falou perfeitamente, por sinal, ao contrário de Blood Ties, no qual ela claramente teve dificuldades com o sotaque italiano). Marion até brincou em uma entrevista, dizendo que o mesmo tempo que levou para decorar 20 páginas em polonês, ela levou para decorar quatro linhas em italiano. Linhas que interpretou muito bem, vale ressaltar; o resto que ficou estranho.

Os dois atores que contracenam com a atriz também fizeram um ótimo trabalho, com destaque para Phoenix. Ele sempre nos surpreende com suas atuações e, desta vez, não foi diferente. Na quarta vez em que trabalha com Gray, ele nos dá sua melhor performance de todas. Por quê? Mesmo sem realmente compreendermos totalmente como Bruno se tornou aquela pessoa e a razão de fazer todas aquelas coisas com Ewa – uma das falhas do diretor aqui -, o ator conseguiu nos fazer compreender o cafetão parcialmente e ter uma relação de amor e ódio com o mesmo. Ódio porque ele faz muitas coisas ruins com Ewa, aproveitando de sua dor, ingenuidade e necessidade de dinheiro, para manipulá-la. Em um diálogo, ela até chega a lhe dizer: “Eu gosto de dinheiro. Odeio você. Odeio eu mesma”. Amor porque em alguns momentos ele mostra que, no fundo, não é um monstro e preocupa-se com a imigrante (apesar dela também usá-lo, por razões óbvias).

Renner, assim como no recente American Hustle, é mal aproveitado no roteiro. Apesar de ser um excelente ator, ele não tem se beneficiado de bons papéis e Orlando é mais um exemplo deles. Aparentemente, sua participação na história é grande, pois está no triângulo com Ewa e Bruno, mas ele é muito mal explorado. O americano tem cenas marcantes com Cotillard e Phoenix, só que merecia mais espaço e atenção do diretor. Talvez Gray podia tê-lo introduzido antes ou dado diálogos maiores com os outros personagens em alguns momentos; ficou uma sensação de incompletude ao fim do filme.

O desfecho de The Immigrant é um pouco previsível, não só por causa das dicas que Gray dá durante o filme, mas porque é, de fato, difícil ver algum fim sem tragédia na telona. De maneira geral, é uma produção que merece todo o reconhecimento dos críticos e expectadores, pois foi feita com os mínimos detalhes e traz um visual e trilha sonora muito bem adequados ao cenário e roteiro.

Porém, se eu for dar apenas um argumento para assistir ao longa, digo performances. Os quesitos técnicos são sensacionais, só que acho que o que vai convencer você a assisti-lo é o elenco. Cotillard e Phoenix estão perfeitos e dividem cenas memoráveis. Eles são tão bem-sucedidos que Gray poderia ter usado apenas as expressões dos dois e feito um filme mudo; seria mais um melodrama clássico na história do cinema. Ewa me lembrou muitas vezes Sophia, interpretada por Meryl Streep em Sophie's Choice (1982). Isto em função do ótimo sotaque polonês e da história das personagens, ambas mulheres com um passado cheio de sofrimento e uma vida conturbada nos Estados Unidos. Sério, às vezes dá vontade de entrar na tela e dar um abraço em Ewa.

Com The Immigrant, James Gray comprova que é um dos raros cineastas que sabem como fazer dramas cativantes e bem construídos. Ele segue mais a linha de Two Lovers do que de seus outros filmes policiais, com mais ação, então, prepare-se para uma produção lenta e muito, muito dramática. Mas desde quando isso é ruim? Dê uma chance.











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