terça-feira, 11 de março de 2014

Resenha: Saving Mr. Banks

Imagem: Reprodução/Movie List Mania

Em 2013, Tom Hanks estrelou dois filmes muito bem feitos e com grandes atuações do elenco, mas que foram adaptações com grandes falhas no roteiro. O primeiro deles foi Captain Phillips, que tornou herói um homem que em nenhum momento foi herói na vida real, e, depois, Saving Mr. Banks (Walt nos Bastidores de Mary Poppins, EUA, 2013). O último conta a história de como Walt Disney (Hanks) conseguiu convencer P.L. Travers (Emma Thompson) a lhe conceder os direitos de Mary Poppins na década de 1960, ao mesmo tempo em que nos revela o passado da escritora na Austrália e o que a influenciou a criar o livro.

Para começar, o longa de John Lee Hancock já interpreta mal seu tema central. O empresário já tinha assegurado os direitos da clássica obra quando Travers foi aos Estados Unidos em 1961 e muitas coisas que vemos na telona, como um passeio que ele faz com ela por um parque da Disney e monta em um carrossel ou quando ele pega um avião para Londres a fim de convencê-la a deixá-lo fazer o filme, foram inventadas. Ou a parte em que a vemos dançando ao som de “Let’s Fo Fly A Kite” com os irmãos Sherman (B.J. Novak e Jason Schwartzman), vai até o escritório de Walt para se convidar à première americana de Mary Poppins e entra na exibição de gala com o Mickey, também são fictícias.

Em relação ao roteiro da adaptação feito pelo estúdio, parece que Travers não aceitou tão bem as mudanças que Disney queria. Apesar de não ter odiado a película, ela realmente detestou as animações e não gostou das músicas. Após a estreia, ela até chegou a se aproximar do homem e pedir para ele retirar as sequências animadas, mas a resposta dele foi: “Pamela, this ship has sailed”, algo como, “Pamela, já era”. Afinal, ele tinha o poder sobre o produto final e ela concedeu os direitos após os longos anos de insistência. A britânica sentiu tanto desgosto que ficou 20 anos sem ver Mary Poppins; mesmo tempo que Disney passou tentando conseguir os direitos do livro.

Porém, não sejamos bobos. Até parece que a Disney iria fazer um filme sobre ela mesma e mostrar o lado ruim de seu criador. Enquanto vemos o caráter difícil e duro de Travers na pele de Thompson, Hanks interpreta um homem carismático, tranqüilo, compreensível e, acima de tudo, um pai que quer cumprir a promessa que fez para as filhas de trazer o livro às telonas. A escritora que dá humor ao filme, mas um humor em função de suas exigências, grosserias e má vontade. Até implicar que Los Angeles é uma cidade mais alegre que Londres porque não chove e faz sol eles fazem aqui! Não sei se tudo que li sobre as diferenças entre Saving Mr. Banks e a história real é realmente verdade, mas pode ter certeza de que eles romantizaram muita coisa. Por acaso, é de interesse da Disney queimar o próprio filme?

Não estou dizendo que Travers foi uma santa - ela chega a ser dura demais às vezes sim -, mas ela mereceu um retrato melhor no roteiro. Sequer mencionaram que ela tinha um filho adotado, Camillus, ou deram pistas de que ela tinha relacionamentos amorosos em sua vida pessoal; ela parece mais uma mulher solitária, sem ninguém. Por outro lado, gostei de algumas cenas, as quais Thompson mostra o lado, digamos, mais bondoso da autora e menos ranzinza. As partes em que ela dialoga com o motorista Ralph (Paul Giamatti) são bem doces, especialmente nos momentos finais, mas a melhor de todas é aquela em que a vemos chorar na estreia de Mary Poppins em 1964 e a personagem explica a Disney que o motivo é a animação dos pinguins para não parecer que era de emoção ao ver a história de sua família vir à tona na tela. Sinceramente, levando em conta que o diretor exibe praticamente as expressões de desgosto de Travers, creio que foi uma cena irônica mesmo, mostrando que as lágrimas eram mesmo de raiva. Se foi o oposto, sinto muito, não ficou convincente que era de alívio depois de tanta luta.

Preciso reconhecer que a produção é extremamente bem feita. A personalidade de Travers foi bem captada (ao contrário de da Walt Disney, é claro), os cartões autografados que o poderoso empresário dá aos fãs realmente existiam e a dificuldade dos roteiristas com a autora também foi fato. Nos créditos, os editores chegam a inserir o pedaço de uma gravação real da leitura do roteiro de Mary Poppins e a mulher realmente era bastante exigente e perfeccionista com sua história a cada linha lida.

Ademais, a adaptação de Hancock é engraçada, divertida e comovente – destaco as partes sobre Travers Goff (Colin Farrell), o pai alcoólatra, e a história de Disney sobre seu severo pai. Hanks e Thompson também brilham em seus respectivos papéis, assim como os atores coadjuvantes. A jovem Annie Rose Buckley, que interpreta Travers em sua infância, está brilhante! No entanto, assim como Captain Phillips, digo que, como ficção, Mr. Banks é um grande filme; são duas horas que compensam o ingresso comprado. Agora, como adaptação de fatos reais...deixa a desejar.

Quem é fã de Mary Poppins pode ter suas horas de nostalgia - apesar de Saving Mr. Banks não mostrar como foram as filmagens e somente algumas cenas da adaptação durante a première americana - e se entreter, mas se você quiser saber como foram os bastidores do processo de produção daquilo tudo e conhecer melhor aqueles personagens, sugiro assistir a vídeos e ler textos de historiadores ou de quem esteve envolvido e não trabalha para Disney. É interessante ver como que o interesse faz as pessoas interpretarem os fatos de outra maneira e, como em Walt nos Bastidores de Mary Poppins, dar uma perspectiva que não é, necessariamente, a mais justa.









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